sábado, 21 de junho de 2008

banco

gosto de falar de Deus porque não é mais profano e não precisa pagar royalties. Deus não cobra juros. bancos cobram juros. muito. bancos são poderosos como deuses. criam e descriam. cobram e dobram. bancos são poderosos como deuses e são a encarnação do capeta. cobram e dobram. não gosto de falar de bancos porque vivo endividado. agora, gosto de falar de Deus porque faço um monte de promessa e não tem problema não cumprir nenhum delas. o cheque especial divino é indulgente. misericordioso. prodigioso. eterno. rezo e faço uma lista de pedidos e agradeço. agradeço sempre. agora, quando entro num banco eu já rogo uma praga. praguejo. praguejo até ficar rouco. maldito sejam todos os banqueiros. com suas fortunas e mania mégalo de ficarem mais afortunados ainda. banqueiros são diferentes de bancários. bancários são meus amigos. fazem a barba diariamente e tem o cabelo de reco do exército. exército é uma espécie de escoteiros com cara de mau. exército ajudam velhinhas a atravessar a rua na marra. te alistam, te pesam, te testam infantilmente com abelhas, colméias e uma conexão a lápis comidos. banco te testa com intimações constrangedoras. já meu amigo Deus não testa ninguém. aberto vinte e quatro horas por dia, encontra-se dividido entre os mais diversos templos. já meu banco não tem caixa vinte e quatro horas no interior, por exemplo. religião e contas bancárias não devem competir. nada deve competir. competição serve pra exaltar o talento de um e destalento de muitos. deixaremos por enquanto competições de lado. troféus, medalhas. pensaremos em bigornas, língua-de-sogra e jujuba. bancos têm balas no balcão. jamais jujubas. eles definitivamente não me conhecem, mas sabem exatamente onde gasto meu quase-dinheiro-meu-dinheiro-deles. bancos querem ser gentis enviando cartões de crédito de graça. cartões de crédito é a ruína do sujeito. é a mina de ouro dos bancos. os juros acabam com o cidadão. progressivo e retrógrado. dispenso gentilezas de bancos. fico apenas com os dez dias sem juros no cheque especial. eu não gosto de bancos. tampouco Deus gosta de bancos. Ele me disse. Deus gosta de dias ensolarados e amores recíprocos. bancos são frios, possuem portas giratórias que apitam, vendem produtos a juros, te colocam em filas e sempre que podem ficam mais ricos. antigamente juros era pecado. acabaram com essa idéia. juros, agora, é dever dominical, infalível, reajustável sempre que possível. agora, cancelar contas no banco, sim, é um pecado. e castigável. via crucis: ligar, conseguir uma informação correta de como fechar uma conta e ir até o banco cancelar, é digno de especial de Natal. o final não é bem feliz pelo desgaste de todo o processo. é um parto. você liga, uma mulher eletrônica te atende, você aperta um número, outra pessoa te atende e se apresenta tão rápido e automático que você não conseguiu traduzir o grunido. até dá uma certa sensação de culpa de não chamar a pessoa pelo nome, sensação que passa bem rápido quando você percebe que encarnou o protagonista de O Processo do Kafka via 0800. te transferem para mais dois ou três atendentes, que te transferem reciprocamente entre o pessoal do setor "transferências de chamada". bancos possuem 457 funcionários para transferências de ligações e zero funcionários para cancelar contas. aconteceu comigo. meu pedido de colar um post-it com meu nome sublinhando a frase "cancelar conta" e grudar no computador de qualquer gerente foi recusada. prático demais. depois de uma hora e 728 transferências (o sofá já tinha meu molde, preenchendo de gesso você teria a forma exata da minha bunda) conclui que, ou eles pensam que você é burro, ou eles não fazem a menor idéia do organograma de hierarquia da empresa, pois sempre cometem o mesmo equívoco de "transferir para o ramal correto" e, olha só que engraçado: musiquinha instrumental de gosto completamente duvidoso até para os padrões dos anos 80, atendente com seu bom dia ligeiro, e, deixa eu adivinhar, você vai me transferir pra pessoa certa?
- olha, é só cancelar a porra da conta (palavrões são filhos da impaciência com a incompetência), dá um delete aí na bosta da tela...
daí eles te chamam de senhor e pedem por favor pra você aguardar um minuto que eu serei transferido. eles acham que "por favor" e "senhor" são suficientes para qualquer tipo de abuso. "bom dia, senhor, por favor, posso te tratar como um idiota, passar a mão na bunda da sua namorada e dar uma festinha no seu apartamento esse finde? antecipo meu agradecimento pela compreensão." "ah, claro que pode moço, você é tão educado". chega um momento que já não existe argumento pra você não cancelar sua conta, a coisa se torna pessoal. você verifica se ainda possui aquela marreta na garagem e quais são as chances de chegar ileso até a embaixada mais próxima pra pedir asilo político depois de estraçalhar alguma agência do seu banco.
enfim, você é solicitado a pagar algumas dezenas de impostos e juros que vão surgindo na sua conta quando ela resolve fechar, e então você comemora a liberdade. que dura na verdade dois meses, até eles resolverem te mandar novamente um cartão de crédito no seu nome. tomei um negocinho que me fez repensar a idéia de descer, literalmente, goela abaixo do gerente, aquele cartão luminoso, atraente, como meu nome completo e aceitação internacional.
nunca li a Bíblia, mas sei que tem uma passagem que Jesus nega a tentação do Diabo. e pelo que eu me lembro a coisa termina aí. não, obrigado, e o Diabo se retira. banco é pior que o Diabo. não existe 'não' pra eles. só existe: vou angariar lucros exorbitantes cobrando juros mais exorbitantes ainda te ameaçando periodicamente com o Serasa e o SPC.
uma espécie de estelionato sofisticado. sofisticadíssimo. maldito sejam todos os diabos e seus hábitos de estelionatos sofisticados.

Um comentário:

Anônimo disse...

hauiahuiahiu!

Muito bom!!
ri horrores.