segunda-feira, 28 de julho de 2008

Sintoma

Pelo recalque, pela idéia. Assim. Suspiros e uivos do vento. Frio. Tempo de pensar. A câmera se afasta ao gesto do diretor. Assim. O close, o zoom. O momento certo. Plano americano. Corta. O casal, ocasionalmente se fala. Se afastam e pensam no devir. Absolutamente individual. Como a luta. Absolutamente trivial. Como a luta. Honestamente sincero, em seus anseios. Na marra, ela foi aprendendo sobre cada segundo do entardecer, sobre cada tonalidade branda e acesa. Sobre as frações e as erupções de pensamentos presentes nela. As erupções. De todas as qualidades e gostos. O mineiro é simpático demais. É poeta de nascimento. Afável. Afáveis. Quando criança, sonhava em ser Deus e controlar vida e morte. Ao bel prazer. Quando crescido, buscava espadas e dilemas, princesas e carrinhos. Ao bel prazer. Quando adulto, pacato e torpe quando necessário, em seu corsário negro, ao som do mineiro ao fundo, em pé, espera sua vez na catraca. A catraca emperra quando não paga e não escapa à sorrateira habilidade infantil. A bola escorregadia, na chuva desliza e escorre junto à guia, e a água joga no time de cima, pra descer todos os santos e chuva forte ajudam. A bola foi parar lá na rua de baixo. As sensações são boas, como a maioria delas. E estão guardadas, sentadas, quietas, na fila com a senha na mão. Basta agora uma boa lembrança e uma boa memória, um índice remissivo atemporal, e ela te surge como um momento presente e pleno. Como todos os presentes deveriam ser. O desafio de driblar a angústia, no final das contas, é descobrir a maneira mais eficaz de materializar e verbalizar teus sentimentos. E assim então, seremos. Serenos e absolutos. Arbitrários e coerentes com todas as manifestações de nossa contrariedade. Um processo curioso, pra ficar no mínimo, se me perdoam a humildade. Jocoso, jogava bola como um palhaço. Para todo estardalhaço, o tom manhoso. Tinhoso, teimava com sua pirraça. Na praça, estudava o sol risonho. Sem ritmo e precisão, sincopado como todo peito pode ser. Apostava mais naquelas que bicavam o chão e se ascendiam no medo. Sozinho era sua maneira mais eficaz de ampliar sua dimensão lúdica, a mais necessária, e que sintetizava tudo. No final, se é que havia um, pertencia à casta dos resguardados. Pensava nos netos e nos pais e nos avôs. Pensava sempre, como um exercício. Ao bel prazer. Ao belo. Aos netos. À moça do perfil inesquecível. Suas anotações pertencem à terra. Seus olhos. Sua esperança é luz e o caminho agora deve ficar mais prático. Enquanto sonha acordado pode ignorar o diretor e seu mega-fone, suas decisões arbitrárias, e sorrisos triviais, de medo. Este, meu senhor, é o seu merecido momento, e descanse os braços. Apenas escute a nota que toca em seu pensamento.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Livro.

Idéias são o suficiente. Idealismos atrapalham. Nunca tive idéia suficiente para escrever um livro. Livros são repletos de idéias. Idéias sempre são suficientes. E livros podem ser idealistas e sempre perigosos. E tudo que corre risco. Para tudo que foge do alcance. Livros são disponíveis e inalcançáveis. Idéias são inalcançáveis, intocáveis e insuportáveis. Idéias não são presas nem esquecidas. Idéias também são perigosas e são livros e são engraçadas. Nunca tive idéia do que escrever num livro. Idéias suficientes. Nunca fiz idéia de todas elas. Livros são idéias bem pesadas. Livros são idéias suscetíveis à gravidade. Não há gravidade que não seja reclamada num livro. Idéias incabíveis e prolixas pertencem ao universo dos livros densos e simples. Idéias incríveis e livros pretensiosos. Livros são estruturas maciças e ficam estabilizados na estante. Nada se mantém estável com livros por perto. Cobertos de razão e improbidades. Nem as idéias, nem os livros. Nem nada. Muito menos niilismos. Li tudo isso num livro.




segunda-feira, 14 de julho de 2008

todos

não sou mais um velho. e nem mais tempo temos. nem ter porque querer. nem desejar, nem dever. nem dever nada à ninguém. apenas aplausos e agradecimentos. os amigos que se vão e a todos aqueles que sempre estarão por perto, por bem ou por mal. pelo sim e pelo não. pela dúvida. pelo privilégio da hesitação. ode à homenagem. ode ao bom gosto e a tudo que só de se presenciar já faz bem. perto daqueles. longe de tantas. ah, meus amores. meus filhos minha vida meus deuses que sempre me acompanharam. meus eus, todos eles, meus erros, meus acertos. seus acertos e seus erros também. a eles. pra todos os meus bens, por todas as valsas e todas elas com seus lindos vestidos. elas sabiam o que estavam fazendo. elas sempre sabiam! como eu não pude perceber... elas sempre sabiam. e se enganam todos aqueles - e tudo isso, veja bem, são pra todos eles - que sempre pensaram que iriam derrapar, e desviar, e desarticular na hora principal. pela mancada pelo deslize. pelo não-atrito e tudo que cai. pela benção da gravidade. precisamente nesta hora. precisamente e necessariamente e todos os vocábulos de posse e de perda, e de estímulo à dimensão. pelos hieróglifos, pelas desenhos infantis. inclusive os da tv. por todos os rabiscos. pelas beiradas. pela impressão passageira e pela constatação. pelo eterno retorno. cada punhalada, ora só, tal dramatismo, cada ponta pé, preciso e denso, naquele instante. cada toque em cada tecla, cada letra escrita e cada sentimento direcionado e redirecionado. sempre precisamente esparso. sempre. a todos aqueles. ao exercício da dedicação. ao ode eterno. jamais aquilo apenas. são pra elas. são para os pequenos também. toda benção, todas as condições pressupostas às pulsões positivas, e tudo aquilo que emancipa. todas as histórias sem moral alguma, tudo que é ininteligível. pelas rimas mal-formuladas quem sabe. inclusive aquelas. àquelas. àquelas. à todas elas, meu bem. abusando da crase de forma completamente equivocada. pelo talvez. pelo meio e pelo modo. pela forma e a apreciação. ao uso indiscriminado de todas as acentuações. ao suprimento de todas as expectativas. também se trata disso. à todas frustrações, elas são bem-vindas quando evitam megalomaníacos. a mentira é uma verdade megalomaníaca. às duas. aos dois. ambos e todos. como o sucesso periódico e o reconhecimento e o agradecimento e a pausa. a tudo aquilo que indique vida e que indique morte e que indica a mesma coisa num mesmo tom. aos desafinados, com certeza, e a pujança de atitudes levianas. a todos os levianos e levianas. ao desapego do gênero, a todos os tratados antigos e conspirações futuras. constantemente atento às conspirações. e por favor, me prometa, obcecadamente distraído. obcecadamente. e sempre, a todas e todas, redundantemente, publicamente vinculado com a repetição, com a permissão materna de todos os equívocos, que todos sabem, servem pra educar. e educar serve pra evoluir. e a todos os mestres que já tivemos e que teremos. e a todos os músicos de todas as glebas. e todas as repartições públicas e elementos privados. às minúsculas. a todas as propostas inúteis. a todos os fins-de-semanas desencontrados. ao orgulho retumbante no passado. à lembrança. à homenagem. à humildade. a todas as lágrimas que caíram e cairão, por todos os momentos que ainda vamos passar juntos, aos desejos intentos desígnios desenhos e sonhos, de dia de noite, a todos. pra sempre. mesmo que seja apenas nesse instante.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

sinusite

a sinusite reveste a cabeça com um capacete repleto de punchs e jebs precisos. pensar dói. espirrar dá barato, sempre deu. de kombis em movimento e roupas coloridas à mão. espirro e flutuo. levito, assuo, espirro. espaço. esparramo pelo chão. limpo. ao meu redor o silêncio estrondoroso me convida a morrer. morrer de mentira, só um pouquinho, nada muito sério. morre depois levanta. acorda, bem disposto e intencionado. sinusite. voz nasalada, narinas entupidas e cabeça congestionada. congestionadíssima. buzinas mil. o gongo não toca, e quando dá a sinapse sai faísca e é um deus-nos-acuda. o santo dos enfermos não trabalha com tarja preta e vou continuar na água mineral. paulattinamente. suo pra afastar a doença. assuo em vão. a sinusite ronda, espreita, espera, e despacha num resfriado desavisado, de uma friagem descuidada, de um sereno manso e contundente. penso bem devagar agora. enfrento o moinho-nosso-de-cada-dia. olho por olho e toda a legislação de Talião por tabela. agora beijo só as bordas com receio que ela vá me engolir, mais cedo ou mais tarde. tenho tempo de só pensar coisas boas. futebol, jujuba, polenta da mamãe pudim de amor feromônio de Praga toda tentação e toténs coloridos e interativos e júpiter escarlate mitos e heróis irriquietos aos passos largos e marcantes de todas as estruturas que talvez apenas de vez em quando e a graça de ver tudo mais saturado, mais technocolor e a perspectiva de cima faz cócegas e dá um alívio se pensar que ainda me arrasto daqui de baixo e a vontade de rir e a dor na barriga e é de lá que eu vou voltar. febres lisérgicas e seus bibelôs e adornos em módulos e pêndulos. penduricário e papagaios. um parafuso distante. jamais a menos.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Festa Junina

a todos meus antepassados da roça, de onde eu vim:
junino é um menino festeiro. rojões assustam os cachorros. a fogueira esquenta e afugenta os maus espíritos. queimou o meu amor. meu bigode é ralo mas apropriado. minha bota rota é suja na sola.
meu remendo colorido, lembra Volpi no céu. meu dente preto representa ausência e não feijão.
o caipira, sua moda de viola, o gênero musical mais existencialista. a vida no campo, sozinho, rodeado de vida. pensativo, contempla e canta. a vida no campo, remendo no bolso, caldinho de feijão. feijão tropeiro, arroz carreteiro. chapéu de palha e boa educação:
- dia!
- dia, cumpadi.
a paçoca é a coisa mais linda que existe. quadrada, rolha, espatifada, despedaçada. doce. o balão vai subindo. o pé-de-moleque... o amendoim é a matriz da felicidade. tem o milho. o milharal. a pamonha. tem os cavalos, e a cavalgada. as moças tão bonitas, são cortejadas. eu cortejo todas elas. engasgo com a paçoca. às vezes quando como rápido.
o caipira tem uma filosofia que é a base de suspiro. suspiro e contemplação. tem a fogueira. a gente pula. tem a ciranda. tem os amigos e o bilhetinho do amor.
angu. broa. quentão. tem o povo na praça central. conversa fiada. fiada e gostosa.
o sotaque é um deleite. doce de leite. Chico Bento.
toda cortesia é por conta da casa. referência aos santos. ao sacro. referência a Nossa Senhora de Aparecida. minha Nossa Senhora rogai por todos nós, amém. tem as romarias. a procissão.
junino é um menino esperto e festeiro. pula fogueira e solta balão. as bandeirinhas coloridas são fáceis de fazer e presas em barbante.
cultura do dengo.
e mais um punhado de não sei-mais-o-quê.
a roça é plena de tudo aquilo que um faz um bem danado.
a comida. as pessoas. a música.
retiro meu chapéu no instante em que elas passam.
sorrio, cumprimento.
meu cavalo se chama Pangaré. gosto tanto dele que não chego nem a montar no bicho. mas ando ao seu lado, em pé. e levo pra tudo quanto é canto.
a gente pesca e confere o pôr-do-sol. todo dia, pra ter certeza que as coisas são o que são e existirão do modo que devem ser. estar é um ser momentâneo que a gente gosta de perpetuar.
se está bem, está bom.
o Pangaré dorme de pé, nem precisa deitar.
bicho esperto demais.
o caipira é muito romântico. é congênito. oriundo de tudo aquilo que faz muitos sentido. sentido é de sentir. sou devoto de todos os caipiras.
Seu Antônio, Seu Pedro. ô Seu João. obrigado por tudo.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

hoje é o dia internacional da poesia incontida, impossível a caminho de se realizar, ninguém pode, mas pode espiar e sem prescrição de qualidade!
viva!

meu amor
eu te amo
eu te amo
mais
até que
aquele biscoito de goiaba enroladinho
na embalagem antiga e vermelha
que vende no supermercado

meu amor passional é constante mas displicente e disperso.
amo de tudo um pouco, amo até dormir dormindo.

te amo e rimo
sem graça
na marra
amasso
e passo
adiante
adiante só tem você
ui!
hahaha
te amo mesmo, é sério
tudo que tenho é o amor
escondido e tímido
mas dá uma chancezinha pra ele
explode
bum!
caio duro no chão
ligo para os meus pais chamarem uma ambulância
não sem antes perguntar quanto foi o jogo do Corinthians
isso sim vai ser decisivo na minha recuperação
sou muito sensível

mãe, quer um presente bem bonito?
"vai,
boiadeiro que a tarde já vem
leva o teu gado e vai pensando no teu bem."

dedicado a todos aqueles que acreditam na livre emancipação de rimas, não-rimas, de ficção ou não-ficção, indefinível como a própria estrutura, e assim só, declarar:
hoje (mas pode ser amanhã e o sempre) dia internacional, quiçá universal, dos poetas desenganados, torpes, esquecidos em seus cotidianos chatos quadrados patos pra burro, entediantes porque previsíveis.
ao contrário do meu final.
fim.

aliás, em sua qualidade de voltar atrás, aliás essa é a sua única função, e não importa quantas funções você tenha desde que faça bem. aliás, conheço uma palavra que faz muito bem isso: aliás.
se tum-tum-tum e de repente, plaft, escorregadio e bem lentamente. te acudo. posso? com licença então, pré-escrevo lá no aliás, e espero que tu sigas fiel, meu filho: que se quando rima, então meu amigo, alforria! viva!

aqui me despeço e volto pra casa
aqui me desfaço e volto pra roça
aqui desenrosco e me esqueço na praça
assim, sem graça, desmancho uma poça

preposição: a

curioso como algumas pessoas são teimosas e aquela sensação de que você está sabotando a você mesmo e aquela pergunta impossível, por que você faz isso contigo? quem ganha? você não ganha. e eu me pego olhando e fustigando e indo atrás e eu sei o quanto custa isso e o que pode ocorrer em seguida. cabeças baixas, coração mole e todo aquele tormento. chega de tormento de saudade de passado e de ver isso. esquece, desliga, volto atrás, faz de novo, começa outras coisas e pelo amor de deus, larga a mão. é tudo de uma tacada só e te toma pela garganta desce arranhando e seus pensamento engaiolado numa sina e rebate, rebate e volta, e pinica e cutuca e você lá estirado no chão, cansado de bater a cabeça na parede se perguntando pela enésima vez, por quê? por que meu deusinho, por que de novo, por que eu, por que dese forma? tem jeito? não tem jeito, niguém ganha. eu não ganho. você ganha? eu não ganha jamais, você tem razão, você tem toda razão, agora eu percebo como você só agora pode ser tão absolutamente correto e perspicaz. você não ganha, eu não ganho, você não ganha mesmo idiota, sem ofensas agora, não ganha, porque você ainda que insista o contrário sou eu, e somos nós todos nós e só quando todos nós incluindo eles percebemos o quanto todo e quanto nós nós mesmo ao todo somos, aí sim as coisas serão diferentes. e enquanto você for apenas uma parte e o todo se compromete com o zumbido, o zunido, o tilintar, e toda forma de expressão que atormente, atordoe, desmonte e que decline aquilo que ainda nem progride. mas chora. chora demais. claro que ninguém vê e jamais verão, jamais, você não vê e muito menos eu, longe de mim. não quero ver nada. quero ver quem vai ver mais do que eu. eu vejo lá no fundo. tudo é transparente e eu só eu sei o significado das coisas. prontifico e me retiro. chega de ver novamente, chega de analisar, pesar, quantificar, avaliar, comparar, medir, posicionar, alinhar, delimitar, testar, testar novamente, indagar, cumprir, referenciar, imobilizar, soltar, imobilizar novamente, despencar, atirar, resgatar, revolver, receber, renomear, relativizar, relativizar sempre, sempre que pode, alçar ao longe e eterno o sempre.
cair.
para todos aqueles que ainda.
para tudo. pára um momento, respiração profunda, ao âmago. esquisito.
está muito estranho agora.
atenção. acende, apaga. clap. claro, escuro. clap. acende, apaga. clpa. claro, escuro. clap. claro escuro acende apaga clap claro escuro acende apaga claro clap.
esquece. deixa pra lá.
já vou dormir mesmo.
respira fundo novamente, respirar faz um bem danando quando se está apto para. pronto para. adequadamente preparado para. recombolicamente entusiamado para. todas as formas intransitivas indiretas de ser e estar e qualquer.
e começa tudo de novo, Maria, tudo de novo... a primeira nota maestro: dó. suspender! dominar, reter, soltar, procurar, buscar jamais encontrar, encontrar tudo, agora, voltar jogar pra cima debulhar desenhar deter fustigar mexer amedrontar amealhar nada jamais amealhar tornar novamente o que significa retornar e pensar tudo de novo pensando daquela forma que mede que pesa que analisa que retoma que não satisfaz que jamais quer satisfazer que não vai parar enquanto não olhar e encontrar aquilo e perceber que o todo ao redor redondamente enganado estava eu todo esse tempo e não tenho tempo nem pra me arrepender enquanto penso nisso e aquilo e retomo e quantifico e tiro qualquer saldo e ponho no bolso e me dirijo a.
silêncio.
por favor.
preposição.
agora.

"senhoras e senhores, aos vencedores, todos os meus mais sinceros e retumbantes aplausos."
clap, clap, clap, clap.

ainda há tempo. na manga, sempre. na mente e no coração. tudo que faz bem, se guarda na mente e no coração. e mente pode ser espírito se você quiser. há tempo de rever e revisitar. sempre há tempo de revisitar Lisboa. hmmm-hmmm. (em voz alte de pé. tambores).

Não: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer. Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral! Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna! Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!

Fernando Pessoa.